O papel do compliance na reconstrução da atividade empresarial gaúcha – O mês de maio foi marcado pela maior tragédia climática da história do Rio Grande do Sul. Um volume de precipitação equivalente à metade das chuvas de um ano caiu sobre o estado em uma única semana, gerando enchentes que afetaram diretamente quase todos os 497 municípios e mais de dois milhões de pessoas, com especial gravidade nas regiões da serra, metropolitana e do vale do taquari.
Esse triste episódio pode ser visto como um fenômeno da natureza isolado, causado pelo el niño e incontrolável pelo homem. Atribuir ao imponderável é uma maneira de nos confortar diante de tamanha tragédia, na medida em que nos blindamos em relação a qualquer sentimento de culpa ou responsabilidade pelos estragos. Nos coloca, porém, numa posição de absoluta submissão às intempéries da natureza.
Não parece ser a decisão mais inteligente, notadamente diante da recorrência de fenômenos semelhantes. Vale lembrar as chuvas que inundaram a região do vale do taquari seis meses antes, devastando pequenas cidades da região. Não seria o momento de refletir sobre as causas e pensar na prevenção das consequências de episódios como esses?
O debate sobre as causas dessas intempéries cada vez mais frequentes é complexo e precisa envolver múltiplas áreas de conhecimento. A reconstrução do estado não pode esperar o tempo necessário a essa reflexão. Por outro lado, pouco adianta reconstruir sem pensar na prevenção das consequências desses fenômenos, cuja recorrência indica um nível de risco elevado. Na atual quadra de uma sociedade tecnológica, há instrumentos para controlar e mitigar significativamente consequências tão desastrosas, disponíveis tanto ao público quanto ao privado.
É nesse ponto que entram os programas de compliance, especialmente no setor privado. A premissa basilar da conformidade é normalmente indicada pela tríade prevenir – detectar – remediar. A prevenção é a primeira das ações de compliance e depende diretamente da avaliação dos riscos do negócio, cuja prioridade de enfrentamento decorre da combinação entre os fatores de probabilidade e impacto. Logicamente que, entre esses riscos, devem ser considerados não apenas aqueles gerados pela atividade, mas todos os demais que, de alguma maneira, atingem a empresa.
A recorrência de fenômenos da natureza dessa magnitude, especialmente em áreas como a do vale do taquari, indica que está na hora de incluir essas intempéries na matriz de riscos, quiçá entre os mais relevantes, para então elaborar processos de controle e prevenção adequados.
O desafio é complexo. Aliás, são inúmeros os desafios decorrentes das inundações de maio, especialmente ao setor empresarial gaúcho. A retomada das atividades e dos investimentos não é tarefa simples, mas necessária. É possível reconstruir e voltar a alcançar bons resultados. Mais do que nunca, porém, será preciso investir também na prevenção de consequências tão desastrosas e na construção de relações de confiança. Também neste ponto, o compliance é fundamental.
Isso porque, em tempos de crise, a confiança necessária para a reconstrução depende do compromisso com valores como ética, transparência e responsabilidade. Programas de compliance promovem uma comunicação aberta e transparente, necessária nesse momento.
A confiança estabelecida através do compliance facilita a formação de parcerias estratégicas, vitais para coordenar esforços de recuperação, compartilhar recursos e implementar soluções eficazes. Empresas confiáveis são mais propensas a receber suporte de parceiros e investidores, acelerando a recuperação. Também a retenção de clientes é decorrência da confiança. Clientes que confiam na integridade da empresa continuam a apoiá-la, contribuindo para a estabilidade financeira necessária para superar crises climáticas.
Apostar no compliance, como visto, facilita o engajamento com a comunidade e a construção de um senso de solidariedade e apoio mútuo, essencial para a recuperação econômica local após eventos climáticos devastadores. Dessa receita resulta a construção de uma resiliência de longo prazo, apoiada em uma base sólida para a sustentabilidade econômica contínua.
Enfim, se por um lado não é possível evitar fenômenos da natureza como os vivenciados em maio de 2024, por outro é possível mitigar suas consequências e reconstruir nossos setores econômicos sobre uma base sólida. Para isso, prevenção e integridade precisam ocupar um lugar de destaque na reestruturação da atividade empresarial e a implementação de programas de compliance pode contribuir para isso. Empresas que investem em compliance estão melhor posicionadas para navegar por crises, protegendo seus interesses e contribuindo positivamente para a recuperação e o crescimento econômico sustentável.
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